Plataforma daleGIG: nova ferramenta para criação e gestão de tours

Postado em 14/08/2019, 0:00

“A música em sua essência é insubstituível”

Raphael Evangelista é músico, produtor, designer e empreendedor digital. Também é um violoncelista profissional há 15 anos, fundador da agência cultural 2DL, focada em gerar conexão entre o músico e o mercado – uma expertise que adquiriu ainda nos tempos da banda Duo Finlândia, quando percorreu nada menos que 15 países em turnês. Um dos principais palestrantes da nova edição o TUM Sound Festival, Raphael tem muito a nos ensinar sobre os caminhos para expandir as fronteiras da carreira musical e o que o novo ambiente traz em oportunidades e desafios para o músico. São muitos e as possibilidades também!

Raphael falará sobre a “Plataforma daleGIG: nova ferramenta para criação e gestão de tours”, projeto inovador desenvolvido por ele. Em suma por meio dela o artista pode elaborar as turnês, verificar as viabilidades logísticas, conectar-se com contratantes de shows de todo o país. “Queríamos algo que fosse fácil e eficiente. O mercado possui algumas soluções que conectam o músico a shows, porém nunca vi alguma que realmente sente o que o músico precisa, com os detalhes e assessoria que precisa”, diz ele nessa entrevista ao TUM Sound, onde também fala sobre tantas outras possibilidades proporcionadas pelo advento da internet e ferramentas digitais, como a Inteligência Artificial (AI), a autogestão da carreira (“uma necessidade”) e muito mais. Tudo para facilitar e impulsionar o capital mais importante para o músico: que é a sua arte!

Essa entrevista está carregada de boas dicas e novidades. Uma prévia do que esse sábio dos novos tempos apresentará ao público do TUM, de 3 a 6 de outubro, em Florianópolis. Enjoy!

TUM Sound – Você traz no currículo uma marca invejável de ter levado a sua banda para mais de 15 países. Há quem veja a possibilidade de excursionar fora do Brasil como algo impensável. Quais lições essa experiência internacional te trouxe?

Raphael – A grande lição é planejamento. A questão de elaborar um plano de ação desde o roteiro até a forma e período de captação traz um grande ponto para o sucesso da tour. Saber qual o roteiro e período ideal de viagem, o objetivo da tour, os custos de logística, a viabilidade financeira, o resultado, são alguns dos pontos que pude ir afinando nos processos de construção de tour ao longo desses 16 anos de muitas aventuras e aprendizados. Um planejamento certo amplia as chances de sucesso.

 

Duo Finlândia/Divulgação

TUM Sound – O advento da internet foi um divisor de águas para a música e, claro, para os artistas. Foi uma revolução não só em termos de modelo de indústria como também na forma como o artista deve ser portar. A auto-gestão da carreira, por exemplo, é uma dessas transformações, certo?

Raphael – Com certeza. Eu falo que 99% da gestão do meu projeto e outros que assessoro são realizados por internet. A internet veio para encurtar distâncias de comunicação e isso é a base de uma boa gestão de projeção artística: comunicar. A evolução em algum momento seria inevitável principalmente na possibilidade para a auto-gestão. Porém ela só é bem realizada desde que bem sustentada. É preciso saber como utilizar este meio com maior potencial e sincronizado com o tempo e estilo de cada projeto musical. Sem isso é muito fácil atirar para vários lados dentro do ambiente digital e banalizar a ferramenta digital como mais um caminho ineficiente.

TUM Sound – Qual a importância da auto-gestão hoje para a construção de uma carreira artística, especialmente do “independente”. Aquela história do “ah, eu sou artista e tenho que me preocupar só com a minha arte” caiu por terra, certo?

Raphael – Além da importância é, principalmente, uma necessidade. É a alternativa mais viável para a grande maioria do “independente”. Hoje eu amplio frase da seguinte forma: “ah, eu sou artista e tenho que me preocupar com minha arte, com material de venda, com exposição, com distribuição, etc”. Não precisa ser (e nem deve) um expert de marketing ou administração, nem saber a fundo todos os modelos jurídicos sobre direitos autorais ou distribuição digital, mas é preciso estar muito ciente do funcionamento e existência dos players que fazem parte da cadeia produtiva da música. Quem são? O que fazem? Qual momento devo trabalhar com eles? Com qual objetivo? O ideal é ter um panorama macro dos processos e comandar isso bem orquestrado para que potencialize seu projeto musical. É difícil, eu sei, pois tudo isso tem que caminhar junto com a liberdade de fazer sua arte na mais pura essência e essa é outra arte também. Dosar a ponto de equilibrar o que está sendo produzido com a forma de como será vendido, sem contaminar ou perder a base artística. Mas sinceramente, até por ver diversos casos reais, vejo que os “independentes” evoluem estas características cada vez mais, principalmente, pela necessidade.

TUM Sound – Você fundou a 2DL, uma agência cultural focada em criar conexões entre o músico e o mercado. Fale um pouco sobre isso…

Raphael – Sim, muitos amigos músicos perguntavam como eu conseguia circular tanto e ter uma agenda financeira e artística auto-sustentável com meu projeto: Duo Finlândia. Fui ajudando a produzir uma turnê aqui outra ali… trouxe alguns artistas estrangeiros para tocar no Brasil e vice-versa. Essa “ajuda” evoluiu tanto que amadureceu a ponto de me juntar com outros artistas e montar em 2013 a 2DL, uma agência focada nestas conexões do músico e mercado. Rodamos um serviço chamado 2DLink e chegamos a ponto de trabalhar com 26 artistas, fechando shows, escrevendo editais e elaborando tours. Já são anos intensos de 2DL sempre afinando o trabalho para que muito músico rode o Brasil e o mundo. Eu vejo muito a agência como uma “causa” necessária ao nosso mercado.

TUM Sound – Quem é o artista de hoje e que tipo de mercado é esse que emerge neste novo tempo?

Raphael – Hoje vejo uma elasticidade dos portes artísticos, porém todos bem fundamentados no uso da internet. Temos aquele músico de pequeno porte que está buscando tração em sua carreira, angariando público pouco a pouco, lutando para conquistar uma pequena agenda mensal. Esse músico é auto-gestor, que muitas vezes arregaça as mangas e negocia, faz posts, paga estúdio. É um perfil que admiro bastante, pois tem muita paixão e vence obstáculos. Tem os artistas de médio porte, um segmento que teve uma elasticidade com a onda digital. Hoje este artista transita tanto em casas de shows pequenas como em grandes festivais, resultado de alguns (ou muitos) quilômetros rodados e, claro, “roubadas” superadas. E claro, o artista de grande porte, que já transita em um mercado mais estruturado. Todos eles segmentam seu mercado e procuram seu público no meio de vários públicos que existem, por meio da Internet na grande maioria de seus processos de crescimento. A era digital ajuda a identificar e comunicar com este público e, naturalmente, novas regras foram criadas e novas formas de trabalhar a cadeia a partir desse novo tipo de abordagem e pensamento.

TUM Sound – Em tempos de conexões, não há como fugir da tecnologia. E você tem uma relação muito firme com esse universo. Fale sobre a daleGig, a plataforma que você idealizou para a gestão de turnês musicais.

Raphael – Sim, hoje dou muito mérito onde chegamos com meu projeto (Duo Finlandia) às facilidade da tecnologia digital. Como eu falei, o projeto praticamente não existiria sem a internet. Para começar, cada músico mora e sempre morou em países distintos. As tours são planejadas com pesquisa digital e muita conexão. Hoje é bem mais fácil do que há poucos anos atrás, quando começamos em 2010. Portanto, está cada vez mais prático, porém é preciso saber usar as ferramentas digitais de forma coerente com seu projeto. E é por isso que criamos nos últimos dois anos uma ferramenta digital que auxilie os atores deste mercado. Na agência evoluímos todos os processos a ponto de ter Know-how para construir uma plataforma digital de gestão de turnês, chamada de daleGig. Nela o músico pode elaborar tours, ver viabilidade, ver logística de viagem, conectar com contratantes de shows de todo o Brasil em poucos cliques. Na outra ponta, os contratantes ganham diversos benefícios que engajam na participação e construção destas conexões. Queríamos algo que fosse fácil e eficiente. O mercado possui algumas soluções que conectam o músico a shows, porém nunca vi alguma que realmente sente o que o músico precisa, com os detalhes e assessoria que precisa. Demoramos este tempo para construir a daleGig, com suporte do SEBRAE e Facebook, vendo cada detalhe, conversando muito com músicos, produtores e contratantes de todo o continente para chegar neste formato. Ao ver os primeiros movimentos da plataforma, já posso dizer que vou ver muito músico rodando o Brasil ainda neste ano.

Dalegig tours

daleGIG/Divulgação

TUM Sound –  Qual o cenário que você projeta para o segmento da música nos próximos cinco anos? A Inteligência Artificial, por exemplo, já faz parte da realidade do músico?

Raphael – O que desejo, projeto e trabalho é para que o mercado musical (principalmente brasileiro) se profissionalize e tire o pé do amadorismo que vivemos. Coisas básicas como contrato de show, ou um simples checklist, é visto como burocracias monstruosas para alguns membros desta cadeia! Tem muito a ser feito. E deve ser feito. A plataforma daleGig vem como uma ponta desse trabalho de profissionalização. No caso, ela possui um “manager virtual” chamado de Chico, que orienta músico na tomada de decisão. Queremos que ele evolua seu pensamento empreendedor naturalmente a cada dia que usa a plataforma, de forma fluída e eficiente. São diversos algoritmos que estão ali a disposição do melhor caminho para cada músico. E acredito sim que, cada vez mais, a IA vai chegando como importante aliado a este músico e ao mercado como um todo. O Chico já é uma primeira força dessa possibilidade. Analisando melhores meios, proporcionando valiosas conexões que esquentam o mercado e todo mundo ganha com isso. Se utilizamos a IA e suas ramificações sem nunca perder a essência da arte, teremos muito a ganhar com isso. Até chegarmos ao ponto de a praticidade e a eficiência serem algo tão bem estabelecidos que o músico pode se cercar da ideia inicial de “ah, eu sou artista e tenho que me preocupar só com a minha arte”. Claro que este desejo não chegaria a 100% mas bem próximo, porém o mais importante seria que ele possuiria uma visão muito mais evoluída de mercado. 

TUM Sound – Para concluir. Como ser visto  e ouvido para além dos algoritmos?

Raphael – Ótima pergunta! Acredito muito que a música em sua essência é insubstituível. Por mais que você tenha um algoritmo que te marque shows em um clique, se sua música não é verdadeira e, assim, não tocar as pessoas, a reação não vai acontecer em cadeia. Somos humanos e os algoritmos chegam para melhorar a eficiência no alcance do ouvido certo, mas se mesmo assim a música não toca a pessoa, é bastante difícil o projeto cativar verdadeiramente aquele ouvido. É isso que priorizo como verdade: concentre na sua arte, faça ela sua expressão, que ela será um gatilho para acionar todas as portas a sua volta, por mais poderosas que sejam.