Mulheres na indústria da música
Entrevista por Val Becker (RJ) – Rádio Graviola
Soraia Ferreira é Gestora de Atividades Culturais / Fundação de Cultura de MS. Coordenadora dos projetos e ações nas áreas de música, artes cênicas, artes visuais e audiovisual na Gerência de Difusão de 2010 a 2022. Produtora Executiva do Festival de Inverno de Bonito e Festival América do Sul Pantanal 2019 e Coordenadora Geral do Festival Campão Cultural / 2021. Atualmente na Assessoria de Projetos.
TUM: Soraia, você como uma gestora cultural, ligada a uma instituição pública e que sempre promoveu ações nas áreas da música, artes cênicas e visuais, idealizou e coordenou a produção de festivais, entre outras ações, como vê a evolução do cenário das políticas públicas culturais no Brasil nos últimos anos?
Soraia: Como eu vejo a evolução das políticas públicas culturais no Brasil nos últimos anos… Como políticas públicas sistemáticas, elas são relativamente recentes. A tradição brasileira é de ausência, autoritarismo e instabilidade na área cultural, considerando que o MINC foi criado pela primeira vez em 1985. Estruturas institucionais importantes foram implantadas como o Plano Nacional de Cultura, que instituiu o Sistema Nacional de Cultura, medidas que deram organicidade às políticas culturais, reforçaram o enraizamento federativo e a vocação participativa, e facilitaram o fomento da cultura popular. Esse quadro vai sofrer o retrocesso brutal no governo Bolsonaro, com a extinção do Ministério da Cultura, substituído pela Secretaria Especial de Cultura, vinculada ao Ministério do Turismo. Essa mudança representou uma perda de autonomia e orçamento para a cultura, com a promoção de uma agenda conservadora, destituindo da Cultura o que ela tem de mais essencial, a liberdade de expressão. Entretanto, a comunidade de políticas públicas culturais demonstrou uma surpreendente capacidade de reação e conseguiu a aprovação Lei Aldir Blanc de emergência no contexto adverso da pandemia da Covid-19 e por extensão e mais recentemente, a Lei Paulo Gustavo com foco no fomento à cultura popular e à diversidade cultural, demonstrando sua força para enfrentar desafios inimagináveis. Acredito que estamos vivendo um momento histórico muito promissor, no entanto, ainda há muitos desafios pela frente, como a redução das desigualdades socioculturais, a implantação de ações mais inclusivas, sustentáveis e com a participação da sociedade civil.
TUM: O que você percebe como maior desafio para os gestores públicos na hora de criar estratégias de distribuição dos recursos da Lei Paulo Gustavo?
Soraia: A Lei Paulo Gustavo prevê um montante significativo, o que exige um planejamento cuidadoso para a sua distribuição, pois a diversidade do setor cultural é complexa e composta por uma gama de atividades, algumas bastante vulneráveis.
Portanto, é necessário levar em conta essa diversidade e desenvolver mecanismos que atendam todos os segmentos, flexibilizando o acesso aos recursos.
A necessidade de transparência e responsabilidade: os gestores públicos estão sujeitos a um forte controle social, o que exige que as estratégias de distribuição dos recursos sejam transparentes e acessíveis à população. O que significa que os editais devem ser o mais objetivo e menos burocrático possíveis.
É importante evitar que os recursos sejam concentrados nas mãos de poucos agentes culturais, o que pode prejudicar a diversidade do setor. A criação de estratégias de distribuição dos recursos é um desafio complexo, sobretudo porque os prazos para formulação são exíguos. Assim, o desenvolvimento de critérios claros, a participação da sociedade civil na formulação, o monitoramento e avaliação na aplicação desses recursos são imprescindíveis para garantir o objetivo da lei.
TUM: Você como idealizadora e gestora de projetos de festivais de grande porte, fala pra gente como você vê a importância desses eventos para o mercado da música, de uma maneira geral?
Soraia: Os festivais são uma ótima oportunidade para os artistas independentes e emergentes se apresentarem para um público amplo. Isso pode ajudar a aumentar sua visibilidade e popularidade, o que pode levar a possíveis contratos com gravadoras e oportunidades de circular o seu trabalho.
Contribui no desenvolvimento e promoção de novas cenas musicais e estilos que não teriam o mesmo alcance sem eles. Isso pode levar à formação de novos públicos e à diversificação do mercado da música.
Os festivais são uma fonte importante de receita para o mercado da música, com a venda de ingressos, mercadorias, patrocínios e outros meios, além de ampliar toda uma cadeia econômica e criativa no seu entorno.
São uma forma de promover a cultura e a diversidade musical. Eles podem ajudar a celebrar a música e a arte de diferentes partes do país. A diversidade da música brasileira é um dos seus principais atributos, o que a torna única e rica, e contribui para a sua popularidade no mundo todo.
No Brasil, os festivais de música estão se tornando cada vez mais populares. Em 2022, o país sediou mais de 1.000 festivais, com um público total estimado em 10 milhões de pessoas. Esse crescimento é impulsionado por diversos fatores, incluindo o aumento do acesso à internet e às mídias sociais, que facilitam a divulgação de novos artistas e de vários eventos.